O frenesi das curtas férias que gozo neste momento nao se deixou antecipar pois decidi nao ir a lado algum. Talvez uns dias na zona Benelux, onde estarei a propósito de uma entrevista. Ou provavelmente estarei tao arrasada dado o quase esgotamento auto-induzido próprio de momentos prévios a essas situacoes que nao terei sequer vontade de calcorrear a zona de carro, de lés a lés, de rabo tremido. Posso ainda dedicar uns momentos a actividades mundanas e, porém, necessárias, para as quais normalmente nao resta nem tempo nem paciencia, como o preenchimento da declaracao de IRS ou a tao ansiada arrumacao dos objectos há longo perdidos nos caixotes da cave.
Logo se verá, a disposicao depende dos dias. Ou do sol. Hoje estive de muito bom humor.
Tive uma experiencia interessante. Talvez por estar descontraída - sim, as férias sempre possuem uma utilidade per se, nao necessariamente dependente daquilo que se faz. O fazer nada constitiu um prazer infinito, adieu, sentido utilitário da existencia!
Dizia eu que gozei um dia de hoje com especial deleite. Decidi mever os músculos no ginásio e pus-me a caminho do mesmo, sem uso de outro meio de transporte que nao o próprio - a butes! -, de tralha às costas, o que nao obstante me permitiu sentir o que se passava no meu exterior. Por vezes esquecemo-nos que afinal nao somos o centro do mundo.
É fascinante apercebermo-nos da vida que o bairro onde vivemos em si acumula, o passar dos dias que vai paralelamente acontecendo. Cada um, ocupadíssimo a nível laboral, concentra-se na sua rotina diária, ignorando a dos outros, ali, tao perto. A vida desse bairro, completamente independente da nossa. As duas nao se cruzam, apenas quando temos férias e nos decidimos entregar à descoberta. Por estar sol, diga-se de passagem miraculosamente, as pessoas decidem abandonar as tocas e escarafunchar o que o exterior presenteia. Esse corpo celeste obtém a magnanimidade de conduzir as pessoas a romperem o seu percurso normal. Reparei na idosa que, dona do seu destino, entrega uns minutos, regozijando-se, ao calor dos raios solares. Ali no canto, sentada na sua cadeira-muleta (um tal veículo jamais avistado em Portugal), de faces rosadas viradas para a estrela abencoada. Deixei-me envolver por ruídos, de vozes ou movimentos bruscos de pás no alcatrao que me assolam a imaginacao com caras rudes, suadas, enrugadas de sorrisos, campainhas de bicicletas accionadas em sinal de sobreaviso, apesar dos caminhos de ciclistas bem delineados nos passeios. Ao meio-dia, sente-se o tumulto das compras, os odores do almoco a fazer, ou o cheiro adocicado do gelado que se consome em unidades gigantescas assim que se sinta o primeiro raiar a tocar a pele. Os alemaes sao de facto muito sensíveis às condicoes climatéricas. Engracado que os únicos a nao mudarem de aspecto sao os managers ou empregados da banca, que se acumulam na rua, de facto e gravata, após terem picado o ponto da pausa de almoco obrigatória. Nao os consigo distinguir uns dos outros, tal a originalidade, muito menos por intermédio das vidracas dos restaurantes italianos, aqueles que tao bem conheco por já os ter contado mil e uma vezes (22?), os quais estao plenos, invariavelmente. Tais circunstancias tao favoráveis sao igualmente aproveitados por recém-mamas (atencao ao til), essas provavelmente desesperadas em normais dias de chuva. Sugam os dias de sol até ao tutano e povoam os passeios com seus carrinhos de bebé da chic Chicco, quase numa latente competicao a ver quem tem o carro mais caro, moderno e com mais aplicacoes e/ou funcoes. Passeam-se sem reparar no espaco exiguo que resta a um comum transeunte, esse que se ve forcado a partilhar os seus metros quadrados com ciclistas, tocadores de acordeao, empregados de esplanada, a própria esplanada tao generosa, as mamas e os seus carrinhos. Nao importa se o pé fica entalado, uma mae tem prioridade, afinal alimenta o futuro da nacao!
Deixei-as para trás, essas criaturas tao necessárias, e prossegui o meu percurso. Reparei numa loja de jornais tipo tabacaria, fechada há pelo menos uma semana. Imaginei os artigos da imprensa e as revistas a amarelecerem com o tempo, afinal de contas nao haverá nada mais desactualizado que o jornal de ontem. Quando voltarem a abrir as portas, terao que repor o stock na totalidade, ninguém quererá comprar o Spiegel de há uma semana.
Apercebi-me que as segundas sao o dia de folga dos cabeleireiros. Se comprasse um guia sobre a Alemanha, será que iria encontrar esta informacao essencial como dica de sobrevivencia?
Cheira a pizza, a döner kebab e a flores, a Primavera antecipa-se de forma alucinante. E eu a caminho do ginásio, de estomago vazio, mas de espírito completo.
Com um dia destes nao há razao para estar nervosa, pois nao?
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